quarta-feira, 28 de abril de 2010

Quando a Religiosidade se Transforma em um Problema

Dias desses, em um desses sites que um usuário faz uma pergunta sendo respondida esta por outros usuários, vi uma situação que me deixou extremamente preocupado. Que em pleno século XXI, pessoas bem informadas, que têm acesso à informação, usuárias de internet, têm pensamentos sobre doenças psíquicas que só fariam sentido na Antiguidade e na Idade Média, onde, por não haver outra forma de explicação, deuses, demônios e espíritos eram explicações válidas.
Uma senhora, no site pré-citado, dizia estar preocupada porque seu neto ouvia vozes, e já tinha até mesmo visto o dono destas vozes, e isso estava causando diversos problemas para ele, pois o mesmo tinha atitudes agressivas, estranhas e reprováveis, a mando destas vozes. Qualquer pessoa minimamente esclarecida saberia que este menino tem algum problema psiquiátrico, os sintomas, por exemplo, remetem à esquizofrenia, mas obviamente o diagnóstico só caberia ao médico posquiátrica após todo o procedimento necessário. Essa senhora falava que havia levado o neto a um centro espírita e se deveria continuar levando.
E aí entra o grande problema, independentemente da religião que seguia, ninguém aconselhou esta senhora a levar seu neto ao médico. Jovens, hipoteticamente esclarecidos, com um mundo de informações na ponta dos dedos, todos deram respostas míticas à questão.
Evangélicos diziam que não eram espíritos, e sim demônios, e que ela deveria ir a uma igreja evangélica, e que no centro espírita a situação só pioraria. O discurso dos católicos era similar ao dos evangélicos, apenas trocando igreja evangélica por católico, e aconselhando um exorcista. Os espíritas recomendavam que ela continuasse indo no centro, que ela estava no caminho. Ninguém, a não ser por mim e mais uma ou duas pessoas, que tinham as respostas perdidas no meio de tanta baboseira, aconselhou a senhora a levar seu neto no médico.
Não estou aqui para criticar a religião das pessoas, até porque sou um apaixonado por religiões e respeito todas, embora questione certos posicionamento destas, mas sim para combater esta visão medieval de um problema sério, que só faz proletar um tratamento sério a esta criança. Antigamente qualquer doença era culpa de entes sobrenaturais, até uma simples dor de cabeça era vista como demônios na cabeça (daí a forma sutil com que tratavam esta, fazendo furos na cabeça para os seres sobrenaturais saírem), com o tempo, a evolução da ciência, a descoberta dos microorganismos, começou-se a verificar que as razões das doenças eram físicas, se reservando aos demônios somente as doenças da mente. Mais tarde, com Freud e a psicanálise, outros estudiosos da psiquê humana e ainda, um posterior desdenvolvimento da medicina, e um conhecimento cada vez maior da estrutura do cérebro e do sistema nervosos, mudou-se o foco do tratamento das doenças do cérebro, com explicações psicanalíticas, psíquicas e neurológicas. Essas explicações procuram olhar o problema por diferentes perspectivas, mas uma coisa tem em comum, refutam qualquer influência de demônios, santos, anjos, espíritos, seja lá o que for nestas manifestações "anormais" do cérebro. Portanto, não se sustenta sob a ótica racional levar uma criança com uma doença em centros religiosos de qualquer espécie em busca de uma resposta.
Para mim, falar que a criança está possuída, influenciada, sei lá que termo, por entes malignos é até uma forma de piorar a situação da criança que já sofre com a sua doença. Vai deixar a criança amedrontada e até mesmo culpada, sem saber o que fez para merecer a atenção desses malignos seres e a desatenção de deus que deixaram esses demônios fazerem o que bem entenderem com ela.
A religião deve ser usada por essa avó como um bálsamo, um refúgio para enfrentar a doença do neto, não para buscar a cura do neto. Para isso, se curável for, existe a medicina. E se não for curável, a medicina proporcionará a melhor qualidade de vida possível para essa criança, que neste ponto, poderá ter, porque não, o auxílio da religião no enfrentamento desta difícil realidade.
Acho que uma atitude deve ser tomada para verificar a negligência destes responsáveis que em vez de levar seus filhos ao médico, levam a igrejas.
E mais, senti necessidade de pastores, padres, coordenadores de centro espíritas, chefes religiosos em geral, sérios, que sei que existem em todas as religiões, esclareçam isto aos fiéis de suas religiões, e, pelo nível que vi as coisas, até mesmo uma campanha de esclarecimento do governo seria necessária.
Me espanta mais ainda uma coisa dessa poucos meses depois do fim da novela "Caminho das Índias" que tratou de uma forma tão bonita, séria e intensa sobre doenças mentais. Além de existir filmes, como "Uma Mente Brilhante", que contando sobre a vida de John Nash, nos mostra que é possível conviver com uma doença mental, e ainda sim, produzir, e até mesmo, por que não, ganhar um prêmio Nobel.
Quem tiver uma religião que seja feliz nela, viva ela da melhor maneira possível, mas não se "ignorantize" por suas crenças.

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