segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Jacques, a Reprodução e a Coisificação do Ser Humano

Atualmente estou ensaiando duas peças na escola de teatro que curso, a Companhia da Ilusão, uma péça do gênero absurdo (Jacques e A Reprodução) e uma do gênero realista (A Rosa Murcha). De "A Rosa Murcha", peça que atuo como convidado, junto com a turma de nível 4, falo depois, agora gostaria de falar de "Jacques e A Reprodução", a peça da minha turma, de nível 3.

"Jacques e A Reprodução" é uma adaptação de "O Futuro Está Nos Ovos" do genial Eugene Ionesco. Como toda peça do gênero absurdo, não somos apresentados ao passado daqueles personagens (embora eles tenham aparecido em uma peça anterior de Ionesco, Jacques ou A Submissão), eles simplesmente estão ali, naquela situação. Não importa o que fizeram antes e nem importa o que eles farão depois, porque o antes e o depois deles não existem, eles são aquilo, aquele momento, eles foram reduzidos, planificados, a ocuparem aquela situação.

Talvez "O Futuro Está nos Ovos" seja ao mesmo tempo a peça mais estranha, mas também a mais clara em relação aos seus objetivos, e à mensagem que traz, que Ionesco escreveu. Por exemplo, "A Cantora Careca", o grande clássico do autor, para ser entendido, é preciso muito mais que assistir ao espetáculo, é preciso estudar e entender tudo o que permeou o processo criativo do autor.

O "Futuro" não! Na peça está ali, clara a sua crítica. Mas, isso não diminui a estranheza e o desconforto causado pela peça, porque ela é uma crítica "hepática" à nossa sociedade, à sociedade capitalista, produtivista,. consumerista, etc.

Os personagens, meio humanos, meio galinhas, são a grande representação disto. Ora, para que servem galinhas na nossa sociedade, para dar ovos e carne para os seres humanos. Uma granja, atualmente, é algo totalmente industrializado, mecanizado, se tratam os frangos como se eles não fossem seres vivos (aliás, de certa forma dada a artifciliadade da produção, do crescimento, de tudo, eles meio que realmente perdem esta característica...).

E assim é o homem também. O homem hoje perde sua individualidade para produzir. Sim, o ser humano nasce fadado a fazer dinheiro, a ser um profissional de sucesso, a trabalhar feito um condenado, muitas vezes em algo que não gosta, para, simplesmente, produzir, porque é isso que a sociedade espera dele.

Quantas vezes deixamos de fazer o que queremos, porque a sociedade nos obriga a fazer algo diferente? Quantas vezes somos obrigados a viver um processo estressante, que não nos agrada, que nos torna infelizes, porque é o que se espera de uma pessoa de tal idade, de tal sexo, etc.

A sociedade exige produção, exige consumo, e essa exigência passa a pautar nossa vida. Perdemos a individualidade, perdemos a humanidade. Viramos galinha, a servir para a alimentação do sistema capitalista.

Jacques Filho, meu personagem, é a figura mais emblemática de tudo isto, um rapaz, jovem, que queria somente ficar ao lado de sua amada Roberte II, mas que é separado dela e obrigado, contra sua vontade e a custa de sua felicidade, a produzir, produzir, produzir ovos, ovos e mais ovos. Ainda que para isso tenha sofrer. Afinal todos os seus ancestrais assim o fizeram, o seu sogro assim o fez, então é obrigação dele fazê-lo.

Apesar da montagem do diretor Rodrigo Motta puxar mais para o cômico, a peça em nenhum momento perde essa sua essência perturbadora, ácida e altamente crítica. Se o riso vir, vem da própria identificação das pessoas com aquela situação. Vem da própria verificação da pessoa com a sua galinização, sua coisificação. Vem da própria identificação das pessoas, que se sentem, muitas vezes, uma criança indefesa, mas que são obrigadas a produzir, produzir, produzir, e a cumprir seus papéis sociais estabelecidos pelos outros.

Vale muito a pena conhecer essa peça, que foge do lugar comum. Que no mais profundo absurdo, descreve perfeitamente a nossa realidade. Até porque, nada é mais absurdo que a realidade.

"Jacques e a Reprodução"

Livre adaptação de "O Futuro Está Nos Ovos" de Eugene Ionesco

Direção: Rodrigo Motta

Assistente de Direção, figurinos e cabelo: Érica do Vale

Maquiagem: Clara Morgado

Elenco: Amanda de Lucca, Bruna Cordeiro, Bruna de Freitas, Daniela Scalabrini, Gabriel Chaga, Laura Carvalho, Miriam Jean Miller, PH Amorim, Rejane Bezerra, Renato Carauta e Wards Fogagnolli.

Data: 24  de novembro de 2011 (quinta-feira)

Horário: 19h30 min e  21 h3 0min

Local: CNEC - "Centro Cenecista de Educação Profissional Felipe Tiago Gomes"
          SGAN 608, Conjunto C - L2 Norte - Asa Norte - Brasília-DF

Convites: Serão retirados, mediante doação de 1 kg de alimento ou 1 agasalho, respeitado o limite de lotação (108 lugares) nos seguintes locais:

               1. SEDE DA COMPANHIA DA ILUSÃO

                SCRS 510 BL. C Entrada 18 – Sobreloja (W2 Sul)
                De segunda à sexta das 09h00 às 12h00 e das 14h00 às 18h00

             
                2. NO LOCAL DO ESPETÁCULO
                01 hora antes do início do espetáculo

Informações: (61) 3242 - 3544
Site: http://www.companhiadailusao.com.br/









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